Repudiei sempre que me compreendessem. Ser
compreendido é prostituir-se. Prefiro ser tomado a sério como o que não sou,
ignorado humanamente, com decência e naturalidade.
É que a banalidade é uma inteligência e a realidade,
sobretudo se é estúpida ou áspera, um complemento natural da alma.
É humano querer o que nos é preciso, e é humano desejar o que não nos é
preciso mas é para nós desejável. O que é doença é desejar com igual
intensidade o que é preciso e o que é desejável, e sofrer por não ser perfeito
como se se sofresse por não ter pão. O mal romântico é este: é querer a Lua
como se houvesse maneira de a obter.
Se é; foi isso mesmo. Se não é, passe por o que
poderia ser, e a intenção valha pala metáfora que falhou.
À porta da cabana que não tive sentei-me ao sol que
nunca houve, a gozar a velhice futura da minha realidade cansada (com o prazer
de a não ter ainda).
Dormir! Adormecer! Sossegar! Ser uma consciência
abstrata de respirar sossegadamente; sem muno, sem astros, sem alma – mar morto
de emoção refletindo uma ausência de estrelas.
O peso de sentir! O peso de ter que sentir!
Nunca desembarcamos de nós. Nunca chegamos a outrem,
senão outando-nos pela imaginação sensível de nós mesmos.
As verdadeiras paisagens são as que nós mesmos
criamos, porque assim, sendo Deuses delas, as vemos como elas verdadeiramente
são, que é como forma criadas.
Se viajasse, encontrava a cópia débil do que já vira
sem viajar.
Escrevo como quem dorme, e toda a minha vida é um
recibo por assinar.
Durmo quando sonho o que não há; vou despertar
quando sonho o que pode haver.
O que eu sou fora insuportável, se eu não pudesse
lembrar-me do que fui.
Achei sempre que a virtude estava em obter o que não
se alcançava, em viver onde se não está…
Alguns têm na vida um grande sonho e faltam a esse
sonho. Outros não têm na vida nenhum sonho e faltam a esse também.
O homem perfeito do pagão era a perfeição do homem
que há; o homem perfeito do cristão a perfeição do homem que não há; O homem
perfeito do budista a perfeição de não haver o homem.
A ironia é o primeiro indício de que a consciência
se tornou consciente.
Muito mais longe está o homem superior do homem
vulgar que o homem vulgar do macaco.
Renega-se a mulher mas não a mãe, não o pai, não o
irmão.
Começo porque não tenho força para pensar; acabo
porque não tenho alma para suspender.
Pensar? Sentir? Como tudo cansa se é uma coisa
definida.
Há metáforas que são mais reais do que a gente anda
na rua. Há imagens nos recantos de livros que vivem mais nitidamente que muito
homem e muita mulher. Há frases literárias que têm uma individualidade
absolutamente humana.
Basta que eu veja nitidamente, com os olhos ou os
ouvidos, ou com outro sentido qualquer, para que eu sinta que aquilo é real.
São sempre cataclismos do cosmos as grandes
angústias na nossa alma.
O apagamento integral da vida e da alma, o
afastamento completo de tudo quanto é seres e gente, a noite sem memória, nem
ilusão, o não ter passado nem futuro.
A violência foi sempre uma forma esbugalhada de
estupidez humana.
Combater é não ser capaz de combater-se. Reformar é
não ter emenda possível.
O que eu quero deveras, com toda a intimidade da
minha alma, é que cessem as nuvens átonas que ensaboam cinzentamente o céu; o
que eu quero é ver o azul começar a surgir de entre elas, verdade certa e clara
porque nada é nem querer.
Em tudo sou o que não sente, para que sinta.
Os homens de acção são os escravos involuntários dos
homens de entendimento.
A vida deve ser, para os melhores, um sonho que se
recusa a confrontos.
Sem comentários:
Enviar um comentário