Os que verdadeiramente sofrem não fazem plebe, não
formam conjunto. O que sofre sofre só.
Uns nascem escravos, outros tornam-se escravos, e a
outros a escravidão é dada. O amor cobarde que todos temos à liberdade é o
verdadeiro sinal do peso da nossa escravidão.
Tudo é nós, e nós somos tudo; mas de que serve isto,
se tudo é nada?
Tudo quanto buscamos, buscamos por uma ambição, mas
essa ambição ou não se atinge, e somos pobres, ou julgamos que a atingimos, e
somos loucos ricos.
Sábio é quem monotoniza a existência, pois então em
cada pequeno incidente tem um privilégio de maravilha.
Posso imaginar-me tudo, porque não sou nada. Se
fosse alguma coisa não poderia imaginar.
A ladeira leva ao moinho, mas o esforço não leva a
nada.
Sou uma casa viúva, claustral de si mesma, sombreada
de espectros tímidos e furtivos. Estou sempre no quarto ao lado … Divago e
encontro, encontro porque divago.
Na vida de hoje, o mundo só pertence aos estúpidos,
aos insensatos e aos agitados. O direito a viver e a triunfar conquista-se hoje
quase pelos mesmos processos por que se conquista o internamento num manicómio;
a incapacidade de pensar, a anormalidade, e a híper-excitação.
Sou qualquer coisa que fui. Não me encontro onde me
sinto e se me procuro, não sei quem é que me procura.
O meu tédio assume aspectos de horror; o meu
aborrecimento é um medo. O meu suor não é frio, mas é fria a minha consciência
do meu suor.
É tão magno o tédio, tão soberano o horror de estar
vivo, que não concebo que coisa haja que pudesse servir de lenitivo, de
antídoto, de bálsamo ou esquecimento para ele. Dormir horroriza-me como tudo.
Morrer horroriza-me como tudo. Ir e parar são a mesma coisa impossível. Esperar
e descrever equivalem-se em frio e cinza.
Despreza tudo, mas de modo que o desprezar te não
incomode. Não te julgues superior ao desprezares. A arte do desprezo nobre está
nisso.
Reduzir as necessidades ao mínimo, para que em nada
dependamos de outrem.
Jazo a vida: Nada de mim interrompe nada.
Repugno a vida real como uma condenação, repugno o sonho
como uma libertação ignóbil.
Sou como um escravo que se embebeda à sesta- duas
misérias em um só corpo.
O homem vulgar, por mais dura que lhe seja a vida, tem ao
menos a felicidade de não a pensar.
Tornei-me uma figura de livro, uma vida lida. O que sinto
é sentido para se escrever que se sentiu.
A vida é oca, a alma é oca, o mundo é oco. Tudo está mais
vazio do que o vácuo. É tudo uma caos de coisas nenhumas.
Os epilépticos são, na crise, fortíssimos; os paranoicos
raciocinam como poucos homens normais conseguem discorrer; os delirantes com
mania religiosa agregam multidões de crentes como poucos demagogos as agregam,
e com uma força intima que estes não lograram dar aos seus sequazes.
Prefiro a derrota com o conhecimento das flores que a
vitória no meio dos desertos, cheia de cegueira da alma a sós com a sua
nulidade separada.
Um dia, no fim do conhecimento das coisas, abrir-se-á a
porta do fundo e tudo e tudo o que fomos – lixo de estrelas e de almas – será
varrido para fora da casa, para o que há recomece.
Existo sem que o saiba e morrerei sem que o queira. Sou o
intervalo entre o que sou e o que não sou, entre o que sonho e o que a vida fez
de mim, a média abstrata e carnal entre coisas que não são nada, sendo eu nada
também.
Quantas coisas, que temos por certas ou justas, não são
mais que os vestígios dos nossos sonhos, o sonambulismo da nossa incompreensão.
Sou altamente sociável de um modo altamente negativo.
A alma que é dada ao indivíduo não deve ser emprestada ás
suas relações com os outros. O facto divino de existir não dever ser entregue
ao facto satânico de existir.
Ter opiniões é estar vendido a si mesmo. Não ter opiniões
é existir. Ter todas as opiniões é ser poeta.
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